Você já ouviu falar de São Cipriano?
E sobre a poderosa Oração da Cabra Preta?
Ou então sobre o autor do famoso livro de bruxaria com o título homônimo
O Livro de São Cipriano?
Conheça a história do homem que deixou de ser bruxo para se tornar
santo.
Ao longo da história existiram dois personagens hoje conhecidos como São
Cipriano. Um deles foi um feiticeiro que se converteu ao cristianismo enquanto
o outro, São Cipriano de Cartago, foi santificado pela Igreja Católica e é
conhecido como o Papa Africano.
A história de ambos se confunde, de forma equivocada, e isso faz com
que, na cultura popular, acabem se tornando um só.
Aqui falarei sobre o bruxo, feiticeiro e Santo de Antióquia, o autor do
famoso livro mencionado acima.
Cipriano nasceu em 250 d.C. na região da Antóquia, entre a Arábia e a
Síria, e era filho de ricos pagãos. Desde criança foi induzido ao estudo das
ciências ocultas como a adivinhação, a astrologia, a alquimia e diversas formas
de magia.
Durante a juventude ele viajou por muitos países, como a Grécia e o
Egito, incorporando os conhecimentos com os quais se deparava, até que chegou à
Babilônia, onde pode conhecer a cultura obscura dos caldeus.
Nessa mesma época ele teve a oportunidade se encontrar com uma poderosa
bruxa, Évora, com quem aprimorou técnicas de premonição e de quem herdou valiosos
manuscritos, assim que a feiticeira morreu.
A dedicação aos estudos e as práticas de magia negra lhe conferiram
grande poder, colocando-o num patamar acima dos demais feiticeiros da época.
Cipriano acabou se tornando muito conhecido, e bastante temido, por onde
passava.
Mas por que Cipriano, um poderoso bruxo, se converteu ao cristianismo?
Diz a lenda que tudo se deu por conta de uma mulher, Justina.
A rica e bela donzela também fora educada dentro das tradições pagãs,
mas se convertera ao cristianismo após ouvir as pregações de um diácono,
Prailo, e passou a se dedicar somente às orações, preservando sua pureza. Tão
grande foi o poder de persuasão de Prailo que os pais da jovem seguiram pelo
mesmo caminho.
Porém chegou o dia em que Justina foi concedida como esposa a um rico
jovem chamado Aglaide, que por ela se apaixonara. Mas a jovem não o aceitou
como marido.
Inconformado, Aglaide pediu ajuda ao poderoso Cipriano, certo de que
assim poderia tê-la como esposa.
O bruxo, após receber vultuosa quantia, utilizou de todo seu
conhecimento nas artes místicas para que a jovem cedesse aos encantos de
Aglaide, mas em vão.
Utilizando-se de orações e com o “sinal da cruz”, os feitiços do bruxo
não a atingiam.
Cipriano percebeu que nem mesmo seus mais poderosos feitiços ou a força
dos demônios com os quais atuava eram capazes de vencer a força da fé daquela
moça.
O bruxo se desiludiu com a prática magia negra, percebendo que havia
algo mais poderoso que ela.
Sob a influência de Eusébio, um amigo cristão, o feiticeiro abandonou as
práticas de ocultismo e acabou por também se converter.
Como prova do seu arrependimento Cipriano queimou todos os manuscritos
que possuía e entregou aos pobres toda a riqueza que acumulara até então, com a
prática de bruxaria.
Porém as notícias da conversão de Cipriano e das obras cristãs
realizadas pelo antigo feiticeiro, e por Justina, desagradaram o imperador
Diocleciano e eles acabaram sendo presos.
Diocleciano, aparentemente, se utilizara do poder de Cipriano em
diversas ocasiões e a ideia de que não mais poderia fazer uso deles o
desagradou bastante.
Frente a frente com o imperador, Cipriano e Justina foram forçados,
através de tortura, a negarem o cristianismo.
Mas a fé dos dois parecia inabalável e nenhum deles cedeu.
Conta-se a história de que Diocleciano lançou Cipriano e Justina numa caldeira com cera e banha ferventes,
mas eles não esboçaram sofrimento algum.
Um feiticeiro de nome Athanásio (antigo discípulo de Cipriano), que
servia ao imperador, alegou que
as torturas não surtiam efeito devido a algum sortilégio lançado por seu antigo
mestre. Na ânsia de elevar sua reputação diante de Diocleciano, o feiticeiro
desafiou Cipriano. Athanásio conjurou demônios e magias e, julgando-se
protegido, se atirou na mesma caldeira, sendo consumido em poucos segundos.
Percebendo que nada faria Cipriano e
Justina abandonarem sua fé o imperador, em 304 d.C. ordenou a decapitação dos
dois, na Nicoméia (hoje conhecida como Izmit, na Turquia). Os corpos foram
expostos ao público por seis dias até que foram recolhidos por grupos cristãos
e levados para Roma.
Durante o império de Constantino os
restos mortais foram enviados para a Basílica de São João Latrão, considerada a
“mãe” de todas as basílicas do mundo.
Em um capítulo de seu livro, Cipriano narra um episódio ocorrido após
sua conversão:
"Numa noite de sexta-feira, caminhava por uma rua deserta quando
deparei-me com quatorze fantasmas. Essas aparições eram bruxas que imploravam
ajuda. Respondi-lhes que havia me arrependido de minha vida de feiticeiro, e
que havia me tornado temente a Jesus Cristo. Logo depois cai em sono profundo,
e sonhei que a oração do Anjo Custódio me livraria daqueles fantasmas. Ao
despertar tive uma breve visão do Anjo. Assim, auxiliado pela oração de São
Gregório e do Anjo Custódio, esconjurei e livrei a alma atormentada das
bruxas."
O famoso Livro de São Cipriano foi redigido antes de sua conversão, mas
o mistério que envolve a vida de Cipriano também interfere em seu livro.
Se ele mesmo havia queimado seus manuscritos como prova do seu
arrependimento, como a obra surgiu?
Desconhece-se quando e quem reuniu e traduziu os manuscritos que deram
origem ao livro. Originalmente escritos em hebraico, foram traduzidos para o latim
e, posteriormente, enviados para diversas partes do mundo.
Porém, o livro sofreu significativas alterações no decorrer dos anos, o
que deixa dúvidas sobre a fidelidade das versões atuais. Tanto que hoje não
mais existe o Livro Gigante de São Cipriano, pois ele foi dividido em dois
volumes: O Livro da Capa Preta e o Livro da Capa de Aço.
Essas obras enfatizam um mesmo acervo mágico central, e ainda exaltam o
cristianismo e a vitória do bem sobre o mal. Porém, existem grandes diferenças
no conteúdo. Enquanto alguns exemplares apresentam histórias e rituais
inofensivos, outros apelam para a magia negra.
Num aspecto geral. Os livros contem instruções para o tratamento de
moléstias, além de cartomancia, esconjurações e exorcismos.
A famosa Oração da Cabra Preta, a Oração do Anjo Custódio e diversas
outras famosas na crença popular também estão presentes nesses livros, além dos
rituais de como obter um pacto com o demônio, como desmanchar um casamento e o da
caveira iluminada com velas de sebo.
No Brasil, os Livros de São Cipriano são usados largamente nas religiões
afro-brasileiras, e se tornaram-se um "almanaque ocultista" de fácil
acesso. Há ainda os mitos que os cercam: muitos consideram ser pecado possuí-los
ou simplesmente tocá-los. De qualquer forma, o tema São Cipriano e tudo que o
cerca é um campo de estudo e pesquisa muito interessante para os ocultistas,
religiosos e aventureiros.
A fantástica trajetória do bruxo e santo da Antióquia representa o elo
entre Deus e o Diabo, entre o puro e o pecaminoso, entre a soberba e a
humildade.
São Cipriano é mais que um personagem da Igreja Católica ou um livro de
magia: é um símbolo da dualidade da fé humana.
Porém, existem duas intrigantes questões que permanecem sem resposta.
Teria realmente Cipriano queimado seus manuscritos ou ele os entregara a
algum de seus discípulos? Como teria então surgido seu livro caso os
manuscritos tivessem realmente sido queimados? Seriam os livros atuais atribuídos
a São Cipriano meras compilações de rituais cuja autoria fora a ele atribuída
devido à popularidade de seu nome?
A fortuna acumulada por Cipriano graças aos “trabalhos” por ele realizados
teria realmente sido distribuída entre os pobres ou teria sido entregue totalmente
à Igreja em troca da absolvição dos seus pecados?
Questões que talvez nunca sejam respondidas, mas que não anulam o fato de
que São Cipriano é um personagem bastante intrigante.
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